O dia de  Natal está quase aí, e para mim o maior sinónimo de Natal é família. Por isso mesmo, decidi, hoje, ter uma conversa um bocadinho diferente do habitual. Decidi que a edição natalícia dos meus lanches seria de mãe para mãe, e convidei a Marlene Pequenão, também conhecida como Mãe Copinho de Leite.

Em novembro de 2011, a Marlene teve o seu dia mais feliz: o nascimento do pequenino Pedro!

Contudo, acabou por “não ser como nos filmes”, como diz a própria Marlene. Apesar de algumas pistas que o Pedro foi deixando nos seus primeiros meses de vida (cuja história pode ler aqui), foi com o inicio da diversificação alimentar que a Marlene e a família foram confrontados com uma alergia alimentar. O Pedro é alérgico às proteínas do leite de vaca e como tal tem que fazer a evicção total do leite da sua alimentação. Se assim não for, as consequência podem ser muito graves, estando sempre à espreita o risco de um choque anafilático. 

Se nós pensarmos em todos os derivados do leite, em todos os produtos/receitas que sabemos que  contêm leite, mais os que têm leite e nós nem imaginamos (e acreditem, são muitos) percebemos que a gestão de uma alergia alimentar é muito, muito difícil. A isto acresce o facto de os meninos como o Pedro não viverem dentro de uma bolha, e terem que encaixar na sua rotina   a escola, as viagens ou até a cantina.

Mas já imbuídas pelo espírito natalício, a nossa conversa não podia deixar de ser sobre esta época. Como será um Natal alérgico às proteínas do leite de vaca?

Comecei por perguntar à Marlene como é que o Natal mudou desde que a alergia às proteínas do leite de vaca (APLV) passou a ser uma realidade.  “A APLV trouxe várias mudanças à minha vida, que se reflectem tanto no meu dia-a-dia como nas épocas festivas, Natal incluído. Passei a ser mais consciente e selectiva em relação à alimentação, não só do meu filho como também do resto da família. A pouca oferta de alimentos aptos para alérgicos acabou por ser um estímulo à criatividade, cá em casa”.

E então como é um Natal “Copinho de Leite” em termos de “menu”? “Na verdade, o nosso menu não sofreu muitas alterações, com exceção, quiçá, da parte dos doces. No dia 24, não prescindimos do bacalhau e, no dia 25, do cabrito assado. Em termos de doces nunca faltam as filhós típicas da beira baixa, feitas pela minha mãe, e os sonhos e as rabanadas, feitos pela minha sogra – agora tudo sem proteínas do leite de vaca.”

Contudo, as dificuldades estão sempre presentes e foi esse o ponto da questão seguinte. O que é  que foi mais complicado de gerir relativamente a esta época, marcada pelo convívio familiar e pelos doces? “Numa fase inicial diria que foi a “evangelização” dos familiares, mas, como a minha família é relativamente pequena, também somos rápidos a adaptarmo-nos às mudanças. Como o meu filho foi diagnosticado logo aos quatro meses nunca houve a tentação de se oferecer os habituais chocolates da época, felizmente!” 

Confesso-vos que esta resposta, e principalmente a seguinte, aqueceram o meu coração. E vão perceber porquê! Sabendo que o Natal de uma criança não se vive apenas em casa e em família, mas também (e muito) na escola, questionei a Marlene sobre a existência de  eventuais limitações quanto à participação do Pedro nas atividades festivas. A resposta foi peremptória. “Não, de todo. Quando há actividades que envolvem comida há sempre um esforço de adaptação e integração. Isto é possível graças a uma relação de grande proximidade e entreajuda que fomos construindo com a escola, ao longo dos anos.”

Que maravilha existir este ambiente! Seria tão importante que esta fosse uma realidade geral.

Ainda sim, todos sabemos que  que forçosamente existem coisas que o Pedro não pode fazer (ou comer), pelo menos da mesma forma, que os seus colegas. Por isso mesmo, perguntei como encara o Pedro essas mesmas limitações. “Tem sido mais ou menos pacífico até aqui, porque nunca conheceu outra realidade. Agora, com seis anos, creio que estamos a entrar noutra fase, bem mais difícil. Com o aumento da autonomia surgem também as questões para as quais nem nós sabemos bem a resposta. Por exemplo, “Eu vou deixar de ser alérgico?”.

Infelizmente, esta é uma pergunta sem resposta, mas continuamos a acreditar que um dia ainda será possível. E até lá, existe ainda um grande trabalho de informação e consciencialização a fazer. Assim, pedi à Marlene que me dissesse uma coisa que gostaria que todas as pessoas soubessem sobre a alergia alimentar. “Gostaria que soubessem que a alergia alimentar é uma condição clínica que deve ser encarada com muita seriedade e que, no limite, implica risco de vida.”

E quanto a um conselho ou alerta para outras mães que também têm uma época festiva alérgica às proteínas do leite de vaca? “Diria para nunca baixarem a guarda, sobretudo nesta altura caracterizada por grandes azáfamas. Para lerem sempre todos os rótulos, terem atenção à contaminação cruzada e para manterem debaixo de olho aquela tia-avó que gosta de oferecer comida à socapa. Nunca façam como eu que, há uns anos, dei a experimentar uma papa nova no dia 31 de Dezembro e, quando toda a gente se preparava para festejar a chegada de um novo ano, eu entrava com o meu filho nas urgências do hospital, com uma anafilaxia.”

E finalizamos a nossa conversa, como não podia deixar de ser, com um desejo para 2018 que aí vem. E o desejo da Marlene é igual ao meuSaúde. Pode parecer um cliché mas é mesmo o mais importante.”

Fica ainda a nota que a Marlene é vice-presidente da Alimenta – Associação Portuguesa de Alergias e Intolerâncias Alimentares, uma associação de enorme mérito que se dedica a unir esforços na sensibilização para as doenças do foro da alergia e intolerância alimentares.

E achavam que este lanche não tinha tido direito a nenhuma iguaria? Teve sim! Uma maravilhosa aletria sem proteína de leite de vaca!

Um enorme obrigada à Marlene e um Natal muito feliz para a família Copinho de Leite e para a sua, que me está a ler!

Mãe Alecrim